O Governo de Goiás decretou na última terça-feira (29) que a execução dos hinos Nacional e de Goiás será obrigatória nas escolas de ensino fundamental da rede pública estadual uma vez por semana. A canção goiana destaca a figura do Bandeirante, que escravizou indígenas que habitavam as terras goianas. No cruzamento das duas principais avenidas, em Goiânia, ainda há uma estátua em homenagem a ele.
A composição traz referências ao Anhanguera, apelido dado a Bartolomeu Bueno da Silva, que na língua indígena, significa “Diabo Velho” ou “Espírito Maligno”. Ele foi um dos primeiros paulistas a explorar o Brasil Central, no século XVII. “Anhanguera, malícia e magia/ Bota fogo nas águas do rio/ Vermelho, de ouro assustado/ Foge o índio na sua canoa/ Anhanguera bateia o tempo”, diz a letra de Joaquim Jayme.
“Os paulistas, até hoje, carregam muito isso: se não fossem eles, não seríamos nada”, explica o professor de História do Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação (Cepae/UFG), Allysson Fernandes Garcia. Ele acredita a obrigatoriedade pode trazer dois cenários: o de contestação do mito ou uma “suposta cidadania”, por cantar a letra em frente à bandeira.
“Cantemos aos céus/ Regência de Deus/ Louvor, louvor a Goiás! […] A colheita nas mãos operárias/ Benze a terra, minérios e mais/ O Araguaia dentro dos olhos/ Eu me perco de amor por Goiás!”, diz outro trecho da composição.
A secretária de Educação do Estado de Goiás, Fátima Gavioli, afirma que não há problemas em discordar do hino. “Se o aluno não concorda e ele se posiciona ali, quietinho, fecha a boquinha em um canto, tem que respeitar isso”, afirma.
Ao ser questionada sobre o fato de que o hino pode enfatizar um episódio histórico negativo, a secretária disse que leu sobre isso, mas que na cidade dela é cheio de ruas e avenidas com nomes de coronéis. E que, segundo ela, o decreto pode chamar a atenção para corrigir algum erro histórico. Entre os professores e a Secretaria, já existe um movimento para instalar um plebiscito sobre o assunto.
O decreto ainda afirma que os dirigentes das escolas “devem adotar as providências necessárias ao cumprimento da obrigação”. E a secretária completa: “não é possível que a gente continue criando os nossos filhos e alunos sem que eles conheçam os símbolos, a história”.
Já o professor Allysson rebate a ideia. “Será que é, de fato, postar-se de frente à bandeira e tocar o hino, construir para a cidadania dos sujeitos? É superficial demais, de baixo para cima”, questiona.